Era
uma sexta-feira nublada, com uma umidade no ar que te deixava molhado
por dentro. A praça respirava uma energia cansada. E as pessoas
arrastando o passo...
Parou um menino do meu lado. Parou parado. E ficou escutando a música. Escutando de verdade. Ele devia ter uns 10 ou 12 anos. Assim que eu terminei, ele pediu mais uma. Toquei. E, de novo, ele ficou ouvindo até o fim.
- Esse é seu trabalho? - ele perguntou.
- É.
- Você ganha muito dinheiro, né?
Ele exibia um sorriso malicioso. Respondi apontando pro chapéu que parecia até furado.
- Olha que hoje não é o dia de ficar rico, não!
- Mas os outros dias, você ganha mais!
- Costumo ganhar um pouco mais, é verdade.
- E o que você faz com esse dinheiro?
- Ué?! Eu como! Pago as contas! Sei lá!
Aí, ele ficou atônito, como se eu tivesse dado uma resposta totalmente fora do comum.
- E você? - eu perguntei. Vai para escola?
- Em Copacabana.
- Você mora por lá?
Ele desviou a cabeça, visivelmente incomodado com o assunto. De fato, já era quase uma hora da tarde e eu apostava tranquilamente todo o dinheiro que não estava no chapéu que esse menino passaria o dia na praça.
- É que eu sou bandido.
Ele falou num tom muito sério e desafiador, olhos nos olhos.
- A é?
- Você não acredita?
- Não sei.
- Então vou pegar uma arma e matar alguém.
- Matar pra quê?
- Pra você ver!
- E a pessoa? Coitada!
- Mas é que você não acredita!
- O que te importa?
- Você não acha que tenho cara de bandido?
- Ninguém tem cara de bandido!
- Então deixa que eu vou lá!
Ele falou e não se mexeu um centímetro. Mas ficou repetindo, para ele mesmo, bem chateado: "Eu queria fazer isso agora, para você ver... Ter uma arma..."
E logo virou para mim de novo.
- Você já matou alguém?
- Não.
- Você já conheceu bandidos?
- Mais ou menos.
- Já segurou uma arma?
- Não!
- Mas você não tem emoção na sua vida?!
- ... ?
- O que é que você faz na vida que te emociona?!
- ... Sei lá... Muita coisa...
A provocação foi trivial mas suficiente para me deixar desarmada. Fiquei procurando em vão algum exemplo, alguma lembrança, alguma realização legal ou minimamente emocionante da minha vida...
- Pois é...
- Toca mais uma!
- O quê?!
- Uma música que eu conheça.
- Tipo o quê?
- Tipo pagode.
- Não toco pagode...
Respirou fundo com ar de: "Realmente você não presta".
Me arrisquei num samba mais conhecido.
Já nos primeiros acordes, o rosto dele se iluminou.
- ALCIONE!!!
Confesso que eu não esperava isso. E ele se pôs a dançar, sozinho, no meio da praça, sorrindo e cantando. Quando acabou a música, ele veio determinado.
- Agora eu!
Pegou o microfone e o violão, naquela animação toda. E de repente parou, meio sem graça.
- É que não sei cantar...
- Mmm... Sabe rimar?
- Também não...
- Então vai falando o que quiser.
- Já sei! Vou descrever as pessoas! A moça de bolsinha preta e sapatos altos. O coroa de óculos e casaco marrom. As duas meninas rindo com cabelo comprido e uniforme do colégio. A senhora da banca que vende boneca e que está com frio. O rapaz de blusão que parou para comer uma pipoca...
Não tinha ironia nem maldade na brincadeira. Ele simplesmente descrevia um por um os transeuntes da praça. Segurando o violão ao contrário e tocando algum acorde aleatório entre duas frases.
E ele não demorou muito para chamar a atenção e a simpatia de todo mundo..
Só parou quando ele mesmo quis.
- Mandou bem, menino!
Eu já ia guardando as coisas.
- Você não vai mais tocar?
- É que tá começando a chover. Mais tarde, eu volto.
- Tá bom.
- Qual é teu nome?
- Mmm... Deixa eu pensar... Pedro!
- Tão tá! Pode ser! Prazer, Pedro!
Antes de eu terminar de falar, ele já tinha ido embora.
Parou um menino do meu lado. Parou parado. E ficou escutando a música. Escutando de verdade. Ele devia ter uns 10 ou 12 anos. Assim que eu terminei, ele pediu mais uma. Toquei. E, de novo, ele ficou ouvindo até o fim.
- Esse é seu trabalho? - ele perguntou.
- É.
- Você ganha muito dinheiro, né?
Ele exibia um sorriso malicioso. Respondi apontando pro chapéu que parecia até furado.
- Olha que hoje não é o dia de ficar rico, não!
- Mas os outros dias, você ganha mais!
- Costumo ganhar um pouco mais, é verdade.
- E o que você faz com esse dinheiro?
- Ué?! Eu como! Pago as contas! Sei lá!
Aí, ele ficou atônito, como se eu tivesse dado uma resposta totalmente fora do comum.
- E você? - eu perguntei. Vai para escola?
- Em Copacabana.
- Você mora por lá?
Ele desviou a cabeça, visivelmente incomodado com o assunto. De fato, já era quase uma hora da tarde e eu apostava tranquilamente todo o dinheiro que não estava no chapéu que esse menino passaria o dia na praça.
- É que eu sou bandido.
Ele falou num tom muito sério e desafiador, olhos nos olhos.
- A é?
- Você não acredita?
- Não sei.
- Então vou pegar uma arma e matar alguém.
- Matar pra quê?
- Pra você ver!
- E a pessoa? Coitada!
- Mas é que você não acredita!
- O que te importa?
- Você não acha que tenho cara de bandido?
- Ninguém tem cara de bandido!
- Então deixa que eu vou lá!
Ele falou e não se mexeu um centímetro. Mas ficou repetindo, para ele mesmo, bem chateado: "Eu queria fazer isso agora, para você ver... Ter uma arma..."
E logo virou para mim de novo.
- Você já matou alguém?
- Não.
- Você já conheceu bandidos?
- Mais ou menos.
- Já segurou uma arma?
- Não!
- Mas você não tem emoção na sua vida?!
- ... ?
- O que é que você faz na vida que te emociona?!
- ... Sei lá... Muita coisa...
A provocação foi trivial mas suficiente para me deixar desarmada. Fiquei procurando em vão algum exemplo, alguma lembrança, alguma realização legal ou minimamente emocionante da minha vida...
- Pois é...
- Toca mais uma!
- O quê?!
- Uma música que eu conheça.
- Tipo o quê?
- Tipo pagode.
- Não toco pagode...
Respirou fundo com ar de: "Realmente você não presta".
Me arrisquei num samba mais conhecido.
Já nos primeiros acordes, o rosto dele se iluminou.
- ALCIONE!!!
Confesso que eu não esperava isso. E ele se pôs a dançar, sozinho, no meio da praça, sorrindo e cantando. Quando acabou a música, ele veio determinado.
- Agora eu!
Pegou o microfone e o violão, naquela animação toda. E de repente parou, meio sem graça.
- É que não sei cantar...
- Mmm... Sabe rimar?
- Também não...
- Então vai falando o que quiser.
- Já sei! Vou descrever as pessoas! A moça de bolsinha preta e sapatos altos. O coroa de óculos e casaco marrom. As duas meninas rindo com cabelo comprido e uniforme do colégio. A senhora da banca que vende boneca e que está com frio. O rapaz de blusão que parou para comer uma pipoca...
Não tinha ironia nem maldade na brincadeira. Ele simplesmente descrevia um por um os transeuntes da praça. Segurando o violão ao contrário e tocando algum acorde aleatório entre duas frases.
E ele não demorou muito para chamar a atenção e a simpatia de todo mundo..
Só parou quando ele mesmo quis.
- Mandou bem, menino!
Eu já ia guardando as coisas.
- Você não vai mais tocar?
- É que tá começando a chover. Mais tarde, eu volto.
- Tá bom.
- Qual é teu nome?
- Mmm... Deixa eu pensar... Pedro!
- Tão tá! Pode ser! Prazer, Pedro!
Antes de eu terminar de falar, ele já tinha ido embora.
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